terça-feira, 3 de abril de 2012

Ópera:Capítulo 25





Londres; Highgate High School; quarta-feira; 11:55 da manhã;

- Saiam da frente, saiam da frente!
Todos os alunos que esperavam na fila da cantina, no refeitório do colégio, se viraram para trás para ver a quem pertencia a voz que gritava. mica, ao perceber que fora notado, deu um sorriso singelo e disse, com os ombros encolhidos:
- Mamães na frente. – e segurou Sop pelos ombros, empurrando-a, mesmo contra a vontade da menina, para frente dos colegas.
- O mica é tão indiscreto. – Chay comentou com ar de tédio, da mesa onde normalmente se sentava no almoço. Mel, ao seu lado, balançou os ombros.
- Pode até ser indiscreto, mas ainda assim é fofo. – ela remexeu na bebida a sua frente com o canudinho, olhando para Rod e percebendo o quão alienado o garoto estava. – Rod? – perguntou, de forma que o menino erguesse sua cabeça para lhe mirar os olhos. – Cadê aLuinha?
Já tinha se passado mais de uma semana desde que as aulas tinham voltado na Highgate. Mais de cinco meses que Lua tinha classes naquele colégio e ainda assim se esquecia de que depois do recreio tinha aula de química, e não literatura. Quando Peter, um garoto de sua sala, a avisou que estava levando para estudar no intervalo o livro errado, Luinha apressou seus passos para voltar a seu armário no corredor do terceiro andar.
Depois da semana anterior, que tinha sido tranquila, Thur aparentemente já a estava deixando ter mais liberdade. Brittany nem se deu ao trabalho de olhar no rosto de Luinha depois da volta às aulas.
O fato de Aguiar estar mais relaxado significava que, apesar de seu estômago ter esfriado com o pensamento, Lua estava sozinha naquele largo corredor. Tão sozinha que era capaz de escutar o eco do barulho dos próprios passos; o barulho metálico do cadeado ao abri-lo.
Tensa, Lua puxou a porta do armário, pensando que talvez fosse melhor ter pedido paraThur acompanhá-la. Mas depois riu do próprio pensamento. Não era ela mesma que dizia não ter medo da morte? Então por que, ela se perguntava, seus joelhos estavam tremendo tanto?
Quando esticou seus dedos finos para alcançar o livro azul, uma mão pesada e fria segurou seu ombro. Lua segurou um grito, inclinando devagar sua cabeça para trás no intuito de ver quem era.
Mas para seu imenso alívio, deu de cara com um par de olhos azuis que a encaravam divertidamente.
- Por que essa tensão toda, Marques? – perguntou Todd, um garoto da turma A, a quem tinha sido apresentada na festa de Bennet.
Lua olhou em volta dele, pelo corredor. Nenhum sinal de vida. Apenas ela, ele e a luz que refletia nos cabelos castanhos do menino, vinda das inúmeras janelas de vidro.
- Hm... Você está sozinho? – ela perguntou baixo, depois se sentiu estúpida pela pergunta: era óbvio que ele estava sozinho.
Todd riu.
- Estou, Marques. Calma. Não faço parte de uma gangue que quer te sequestrar ou sei lá o quê.
Lua transformou seu olhar do alarmado para o sério, sem gostar muito daquela brincadeira. Aliás, quem gostaria de uma brincadeira como aquelas quando, realmente, se tinha sido sequestrada por uma gangue?
Ele pareceu perceber o erro, pois deu um pigarro e continuou:
- Desculpe por isso, eu sou muito ruim com piadas.
- É mesmo. – a menina concordou.
Todd se recostou nos escaninhos ao lado de Luinha, admirando-a como se ela fosse alguma jóia rara. Lua corou, só então parando para perceber o bronzeado do menino.
- E então, Luinha – ele começou. – eu estava pensando se você gostaria de comer uma pizza comigo um dia desses.
Ela juntou as sobrancelhas, abrindo sua boca para negar. O que acabou não sendo necessário, uma vez que sentiu alguém lhe abraçar pelos ombros e no segundo seguinte uma voz familiar declarou:
- Ela não está interessada.
Lua virou seus olhos para encarar Thur, que sorria confiante ao seu lado, olhando de forma soberana para o outro cara de ombros largos. Todd esmoreceu-se.
- Ah, vocês... Vocês estão juntos?
Thur continuou a sorrir enquanto Lua absorvia aquelas palavras. Juntos? Ela e o Aguiar? Tudo bem que eles haviam se beijado várias vezes e andavam um com a outro maior parte do tempo, mas ele nunca lhe pedira fidelidade. Nem isso e nem firmara compromisso nenhum com ela. Não estavam ficando, não estavam namorando. Tinham um relacionamento incompletamente completo, sem pé nem cabeça, mas tudo o que ela precisava e pensava até o momento. Só naquele instante, de frente para um pretendente e tendo a proposta do mesmo rejeitada por ela, foi que Luinha começou a pensar a respeito do tipo de relação que tinha com Thur.
Antes que ela pudesse retomar o fio da meada, Todd já tinha se virado de costas e voltado a andar em direção às escadas com o rosto baixo, provavelmente com a falta de graça. Lua sentiu suas bochechas ficarem rubras, virando para Arthur com um súbito sentimento de irritação e dizendo:
- Eu posso muito bem falar por mim mesma.
Ele se desvencilhou dos ombros da garota e olhou-a com as sobrancelhas levantadas.
- Só disse o que você ia dizer. – defendeu-se, mas depois olhou para a face zangada deLuinha por um momento e ponderou. – Ou você iria responder diferente? – levantou uma das sobrancelhas, colocando as duas mãos do lado da cabeça da menina e prendendo-a contra os armários. Lua fixou-se em seus olhos. – Marques, - ele respirou fundo. – sabe a palavra corno? Então, eu não gosto dela.
- Aguiar, sabe a palavra compromisso? Então, a palavra corno não existe sem ela. – Lua rolou os olhos.
Thur riu, estendendo uma das mãos para acarinhar o rosto da garota. Luinha fechou os olhos ao sentir o carinho, deixando que alguns calafrios vindos dos locais onde o rapaz tocava se esgueirassem para resto do corpo.
Arthur aproximou seu rosto do da amada, fazendo com que sua bochecha se encostasse a dela e sussurrando:
- Namora comigo.
Luinha sentiu todos os pêlos do corpo se eriçarem, arregalando os olhos e afastando o rosto de Thur da sua bochecha, para que pudesse lhe encarar os olhos. Seu coração corria em uma maratona fictícia a mil por hora, e sua boca entreaberta deixava claro o estado em que se encontrava: de choque total.
Não que não quisesse ser a namorada de Thur. Ela queria. Muito. Mas ainda havia alguns assuntos com os quais precisava tratar e lidar, como por exemplo, um assassino em série à solta, ou como o fato da última namorada do menino ter terminado cruelmente assassinada.
Depois de ter ouvido vários gemidos reticentes saindo da boca de Luinha, Thur falou com o olhar baixo:
- Eu entendo que você precisa... Aliás, que você deve pensar antes de responder. – ele enfiou uma das mãos que apoiava do lado do pescoço da menina dentro de um dos bolsos da calça, tirando de lá dois papéis finos. – “Romeu e Julieta” está em cartaz na ópera da cidade. A senhora Mabel, nova professora de literatura, sugeriu que assistíssemos para tirar ideias para o trabalho final. – olhou-a intensamente. – Quero sua resposta depois do espetáculo.
Lua fitou o rapaz durante alguns segundos, depois sorriu:
- Tudo bem.

No final da aula, Thur observava Lua sair da escola escondido atrás da escada principal. Queria dar à menina a sensação de liberdade, mas não imaginou que ela pudesse ser tão avoada a ponto de acreditar que ele realmente a tinha deixado algum segundo sozinha. Ele, durante todos os momentos, sempre estava espreitando a sua volta, tensionando-se a cada vez que alguém fazia um movimento suspeito.
Nem pensava o que poderia fazer se visse Brittany se aproximar de Luinha, ou lançar para a menina um olhar mal intencionado. Brittany. Foi pensando nela que Thur estendeu sua mão para apalpar o bolso da frente da blusa. O revólver calibre 38 ainda estava lá, lotado de balas. Balas essas, ele se lembrou, que apenas utilizaria contra o assassino.
Ao ver Lua ir em direção ao estacionamento da escola acompanhada de seu primo, Arthur relaxou. Observou o caminhar lento da garota entendendo enfim os motivos pelos quais Gerald era tão obcecado por ela. É, obcecado. Acabou por descobrir, através de análises policiais, que o menino de aparência doente era apenas... Bem, doente. Ele idealizou em Lua e Ivane sua imagem ideal de uma das personagens do videogame que jogava, por isso as perseguia de cima a baixo. Acreditou que, assim como a rainha da fadas teria feito, Ivane renasceu.
Arthur suspirou, dando um sorriso carinhoso. Gerald, no fim das contas, era apenas só mais um joguete do destino. Não poderia chamá-lo de louco, pois ninguém sabe o que é verdade no mundo em que viviam. Ele era só mais uma vítima do azar. Um bom rapaz, apesar de curioso, que estava no lugar errado na hora totalmente errada...
Thur tirou a mão do relevo que o revólver formava. Desde a volta às aulas andava com ele pra cima e pra baixo no bolso, preparado para usá-lo a qualquer momento, contra quem quer que fosse...
Uma palma ao seu levado o fez despertar de seus pensamentos.
- Até que enfim. – Duan disse, sorrindo largamente. – Estou do seu lado há... – olhou no relógio. – Um minuto, exatamente, e só batendo palmas pra você me notar. Não foi assim que eu o ensinei, Margarida.
Thur afrouxou seus músculos quando viu que se tratava do amigo, então sorriu.
- E aí, Duan, como está indo?
- Hm... Bem. Melhor agora que o treino de futebol vai voltar, não acha?
- Acho que sim... Fiquei sabendo de você e da Missy. – Thur falou, lembrando-se repentinamente. - Por que não me contou?
Duan olhou-o com um sorriso, espreguiçando-se despreocupadamente e dizendo:
- Melhores amigos não precisam necessariamente contar tudo um pro outro, não acha?
Arthur lembrou-se de Lua no exato momento em que viu uma faísca diferente reluzir nos olhos do companheiro, mas nada disse. Também, como poderia?
- Concordo. – ele respondeu. – Mas não acho que a Missy seja uma dessas coisas, er... Secretas.
O loiro chacoalhou os ombros.
- Ela de fato não é. Nós só estamos ficando, nada sério. – observou Thur abaixar a cabeça com um ar de curiosidade. Duan abriu um sorriso torto, felino, e mandou: - Você e a Luinha, por outro lado...
Arthur ergueu os olhos. Se o goleiro mesmo já tinha tocado no assunto, nada mais justo do que Thur continuar:
- Duan... Eu a pedi em namoro. – falou baixo, com medo da reação do amigo.
- Quê? – o loiro levantou as sobrancelhas, surpreso.
- Eu estou... Não, eu sou apaixonado por ela. – enrubesceu-se. – Pensei que você, de todas as outras pessoas, fosse entender.
Duan piscou em choque durante alguns segundos. Thur jurou ter visto um furacão de emoções transparecerem seus olhos verdes: espanto, raiva, rancor, ternura, compaixão e, enfim, a compreensão.
- Desculpe minha expressão – o loiro disse quase cordialmente. – mas você tem que concordar comigo que foi meio de repente. O que eu tenho a dizer sobre isso é que... Eu desejo a você toda felicidade do mundo. Você sabe disso. Se estando com a Lua é a sua forma de se desvencilhar do passado e seguir em frente, saiba que eu vou te apoiar mil por cento nessa ideia. Além do que, minha paixonite por ela já foi superada há muito tempo. – sorriu. – Sabe o porquê de eu, acima de todas as outras pessoas, te entender? – Thur negou. – Porque você é minha única família, Aguiar. Desde que meus pais morreram no acidente de carro, você têm sido o meu único amigo de verdade. Serei eu e você até o fim, parceiro, e não é nenhuma garota que vai mudar isso. Eu apoio o relacionamento de vocês, sei que a Luinha é uma pessoa adorável e que você merece muito.
Thur, no fundo emocionado pelas palavras do rapaz, puxou-o para um rápido abraço entre comparsas. Durante o abraço, Duan sorriu.
- Mas diz aí, - o loiro completou quando se afastaram. – o que foi que ela respondeu?
- Ainda nada. Vou levá-la àquela ópera que a senhora Mabel mencionou. Luinha me dará a resposta no final da obra...
- Ah, é? – Duan alargou o sorriso. – Essa menina está te mudando mesmo. Tudo bem que toda escola vai estar presente, mas nunca imaginei que você estivesse entre eles. Fala sério, você, em uma ópera?
Arthur riu.
- Você também vai?
- Vou sim, Margarida. Para ficar na fila do gargarejo pra você.
Thur sentiu o relevo do revólver se encostar novamente em seu peito, então se lembrou de algo que fez seu tom se voltar completamente para o obscuro:
- A Brittany vai?
Duan pareceu confuso.
- Vai. Vai, sim. Por quê?
Thur trincou os dentes.
- Quero que, enquanto você estiver lá, me ajude a tomar conta de Luinha, para que ela e a Harris não se encontrem sozinhas em momento algum. Acho que a Brittany é mais perigosa do que aparenta ser...
Duan piscou os olhos algumas vezes, ainda em sinal de confusão. Mas como era o seu chapa quem estava pedindo, ele não via problemas:
- Eu faço qualquer coisa.

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