sexta-feira, 30 de março de 2012

Ópera:Capítulo 21




Scott apertou o pescoço de Thur.
Lua teria ficado muito preocupada se não tivesse percebido o quão tonto o zagueiro já parecia estar. Não foi difícil para Aguiar acertá-lo no nariz e ficar por cima do menino, socando-o, por fim, até que esse não tivesse mais consciência.
Arthur postou suas mãos no pescoço de Scott, não de forma firme, como se ele se perguntasse se deveria ou não dar um fim em sua vida.
Luinha levantou devagar, seguindo até ele e observando que, enquanto Thur ponderava entre matar ou não Scott, algumas lágrimas escorriam de seus olhos e gotejavam na ponta de seu nariz.
Tanto suas mãos, Lua observou, quanto as de Thur, estavam sujas de sangue. Sangue do rapaz inconsciente no meio da sala.
- Não o mate. – Luinha disse caindo ao seu lado.
Thur, com as mãos trêmulas envolvendo o pescoço de Scott, olhou para ela.
- Eu tenho que fazer isso, Luinha. – ele respondeu com a voz fraca.
Lua esticou uma de suas mãos até os cabelos de Arthur, que estavam caindo em seu rosto. Vagarosamente, passou a mão por seus cabelos e orelha, repetindo um carinho que já tinha lhe feito.
- Você não é um assassino, Thur.
- Eu não era. – ele concordou. – Mas olhe suas pernas, Lua! Quem eu seria se deixasse vivo o cara que fez isso com você?
Luinha desceu seus olhos até as pernas descobertas, onde estavam algumas marcas roxas. Surpreendeu-se por não ter reparado antes.
Ela voltou a olhar o menino, virando seu queixo pra ela.
- Você seria o meu Thur. Não se torne igual a ele. – apontou Scott com a cabeça. – Você é muito melhor que isso.
Lua envolveu com sua mão livre um dos punhos de Thur, puxando-o delicadamente para cima e afastando-o do pescoço de Scott.
- Marques, eu fiquei com tanto medo de te perder. – ele disse, envolvendo-a em um abraço caloroso e permitindo que algumas lágrimas caíssem.
- Eu também tive medo de te perder, Thur. – Lua também se permitiu chorar. – Apesar de sempre saber que você viria.
Ficaram um tempo abraçados, até ouvirem um barulho alto vindo da direção da porta.
Era Rod, que tinha caído sentado e apoiado suas costas no batente. Havia tanto sangue entre sua boca e nariz que era impossível dizer qual pertencia a quê.
- Rod?! – Luinha gritou, desvencilhando-se do abraço de Thur e indo em direção ao primo. – Molengo... – ela se ajoelhou a seu lado, ainda chorando. – Não acredito que você também veio. Rod... Você... Você estava brigando por mim?!
Ele olhou para a prima e sorriu. Seus dentes usualmente brancos agora estavam manchados de sangue.
- Por quem mais eu brigaria?
Lua abraçou-o com força, chorando mais alto que nunca antes.
Ver Rod e Thur feridos daquele jeito era o bastante para despedaçar seu coração inteiro.Rod com o nariz e a boca arrasados e Thur com um enorme corte em uma das sobrancelhas, originado do primeiro soco que recebera de Scott.
- Confesso que não achei que você fosse vencer o Bennet. – Thur disse se aproximando dos dois, com um sorriso no rosto.
Rod também sorriu e respondeu:
- Confesso que também não, mas tive sorte de ter um vaso de plantas a meu alcance. – ele riu, Thur também. – Não bato em alguém assim desde que o mica quebrou minha bicicleta. Incrível, não?
Arthur esticou uma das mãos para Rod, e esse tocou na mão dele como um cumprimento.
- Parabéns, mate. – Thur disse.
- O mesmo digo pra você. – Rod olhou para Scott e depois para Luinha. – Obrigado por salvá-la.
Thur se preparava para responder quando ouviram sons altos vindo do andar de baixo, como voz de alguns homens e a sirene de uma ambulância.
Arthur, Rodrigo e Luinha se entreolharam.
- Chay e mica. – Rod olhou preocupado para os companheiros.
Thur passou por cima de Rod e Lua, para poder apoiar o garoto em seus ombros pelo outro lado. A menina compreendeu e fez o mesmo, passando um dos braços do primo em volta do pescoço.
- O quê? – Luinha disse. – Eles também vieram?
- Vieram. Alguém chamou uma ambulância... – Thur observou.
Andaram devagar no corredor escuro e estreito, acompanhando o andar manco de Rod até as escadas.
- Aguiar, você acha possível que... Um dos dois...? – ele deixou a frase no ar.
- É o que vamos descobrir.
Chegando ao primeiro andar, foram envoltos por uma luz forte e agressiva, vindo da porta escancarada da frente. Ao acomodarem suas pupilas, observaram um grande farol em um dos dois carros da polícia estacionados na frente da casa.
- Oh, Deus! – gritou uma voz masculina grave, que Rod e Luinha reconheceram imediatamente.
Tio John correu em direção aos três jovens que desciam algumas escadas na frente da casa. Assim que se aproximou o bastante, envolveu-os em um abraço... Todos eles.
Enquanto Luinha e Rod retribuíam, Thur apenas sentiu-se alarmado por ser recebido por tamanha receptividade.
- Filho, Lua. – tio John falou, afastando-se um pouco dos três. A luz continuava a banhá-los, lançando grandes sombras escuras no interior da sala de madeira. – Deus. – repetiu. –Arthur. – olhou-o, com os olhos cheios de gratidão e orgulho. – Obrigado por trazê-los de volta...
A fala do homem ficou reticente. Logo ouviram um dos policiais perguntar, pelo megafone, se ainda existia alguém no local.
Thur assentiu e dois tiras passaram armados por eles, entrando na casa.
Desvencilhou-se do braço de Rod, para que o mesmo pudesse abraçar seu pai direito, e foi em direção a Sophia e Mel. As duas estavam abatidas, olhando para dentro da ambulância estacionada do outro lado da rua.
Alguns vizinhos curiosos arriscavam pôr suas caras para fora das janelas para sondar o ocorrido.
- O que aconteceu? Os meninos... – Arthur perguntou chegando ao lado de Sophia e olhando para dentro do veículo. Chay, sentado em um dos pequenos bancos brancos, sorriu para ele. Já mica... – O que houve com o Borges?
O garoto estava deitado, desacordado, na maca, enquanto dois paramédicos o examinavam.
Chay estava com um corte aberto embaixo de um dos olhos. Seu nariz e lábios também não estavam no melhor dos estados, mas iria sobreviver.
- Acho que quebrei uma costela. – ele disse. – Apenas. – olhou para o companheiro, que, com alguns espasmos nas pálpebras, começou a abrir os olhos. – Já o mica, pelo menos três coisas quebrou...
- Bateram nele tanto assim? – Mel perguntou.
- Óbvio que não. – Micael respondeu rouco, para a surpresa de todos. – Eu sentei o cacete.
- É, ele trouxe uma lanterna... E bateu nos caras com a lanterna. – Chay uniu as sobrancelhas. – Só que as coisas ficaram meio ruins quando um deles tomou posse do objeto.
- E a única, única - Micael deu ênfase. – razão para que eu tenha apanhado assim foi porque eles estavam armados.
- Com uma lanterna. – Mel completou, rolando os olhos e fazendo todos, menos Sophia, caírem na risada.
- Que tipo de idiota trás uma lanterna no bolso do casaco? – Chay perguntou, divertido.
- Talvez o mesmo idiota que precise dela para se defender de dois meio-campo.
Thur arriscou uma risada, seguido por Mel e Chay. Mas Sophia irritou-se o bastante para socar uma das pernas de mica.
- Ouch! – ele gritou. – Só porque eu estou brincando não significa que não esteja doendo.
Ela olhou-o com os olhos magoados, cheios de lágrimas.
- Você é um imbecil, Borges! – ela falou esganiçada, levando as mãos à boca. – Um completo e perfeito imbecil. Como tem coragem de se arriscar desse jeito?
Ao ver o clima gerado no local, Chay sinalizou para Aguiar e a namorada com a cabeça, para que eles se retirassem de lá. Até os paramédicos, que tinham saído para se comunicar com os das outras ambulâncias que chegaram, acharam melhor ficar um tempo afastados.
Ao ver que estavam a sós, mica falou:
- Qual é a sua, Sop?
- Qual é a minha? – ela berrou. – Qual é a MINHA? – meteu-lhe mais dois tapas na perna, arrancando gemidos de dor do menino. – Você acaba de quase se matar e ainda me pergunta qual é a MINHA?
Micael a olhou ultrajado por alguns instantes, depois tomou ar para responder:
- Eu quase acabei de me matar para ajudar uma amiga. E lealdade, quer você acredite ou não, faz parte das virtudes que eu mais prezo. Comitatus, capiche? – moveu a mão, enfatizando seu italiano.
Sophia, ainda nervosa, rolou os olhos.
- Isso foi tão... Imprudente! Até pra você. O que você conseguiu com essa droga de lealdade? Três costelas quebradas!
Ele levantou um dedo.
- Três costelas e um braço quebrado.
- Piorou!
O menino observou Sophia enxugar os olhos lacrimosos na manga de sua blusa de frio. Quando a menina fungou, ele abriu um lento sorriso, arrastando-se na maca da ambulância até que pudesse tocar seus ombros.
- Sop, não precisa ficar preocupada comigo. Eu fiz isso na total intenção de voltar inteiro, como, você pode ver, estou agora. Não vou a lugar nenhum... A não ser talvez ao hospital, mas depois eu volto pra você. – mostrou os dentes enquanto sorria.
Sophia encarou-o durante alguns segundos até afastar o garoto com as mãos.
- Eu não pedi por isso. – olhou constrangida pra baixo. – Quero dizer... Pra você voltar pra mim. Eu não...
- Eu teria feito isso mesmo que você me pedisse que não. – ele disse sincero. – Você sempre foi meu motivo pra voltar, e agora tenho mais um... – desviou os olhos devagar para o relevo visível por baixo da blusa da garota.
Sophia deu um passo rápido pra trás.
- Não!
- Por que não? Eu já disse que...
- Não, mica! – Sophia gritou aos prantos, vendo o menino se esticar ainda sentado na ambulância, para conseguir afagá-la. – Eu já te disse. Não tem como eu ter certeza de... De quem é...
- É meu.
- Eu não sei! – ela limpou novamente os olhos com as mangas. – Não poderia fazer isso com você, mica. Não é justo.
- Você não pode me afastar dele. – apontou a barriga. – Isso sim não é justo!
- Borges, quando você vai entender que você não é o pai?
- Você não tem como ter certeza. – ele trincou os dentes.
- E nem você.
Micael suspirou, depois olhou para o lado direito. Havia uma pequena praça do outro lado da casa onde Scott escondera Luinha, e era por lá que os olhos do garoto vagavam.
Por mais que “mica” tenha soado mais sonoro vindo da boca de Sop, ainda mais depois desse tempo todo, a mágoa de seu peito não parecia querer se dissipar nem um pouco. Respirou fundo e novamente levou seus olhos a garota parada a sua frente.
- Você sabe que eu estou disposto a assumir a criança.
Sophia respirou fundo, agarrando-se em toda sua coragem para respondê-lo:
- Você sabe que não estou disposta a deixá-lo assumir algo que não é seu.
E assim saiu de lá, deixando mica atordoado na maca da ambulância, observando-a ir embora. A vista do rapaz ficou turva, e, antes que percebesse, já estava chorando.
Micael caiu de costas na maca, espremendo as mãos nos olhos e murmurando:
- Vida de merda!

- O que aconteceu lá dentro? – Mel perguntou estarrecida, arrastando Lua, que estava enrolada pelos ombros por um cobertor, para longe dos demais.
A desculpa que utilizou para tirá-la de perto do tio, primo e, bem, Thur, fora que tinham assuntos femininos para tratar. Mel garantiu aos três que havia coisas que Lua só poderia compartilhar com uma mulher, e por mais que Thur se sentisse incomodado ao pensar em não ter algo da garota dividido com ele, permitiu que ela seguisse com Mel.
Quando estavam afastadas das ambulâncias, policiais e amigos, as duas meninas se sentaram no meio fio.
- Você deve estar sentindo muito frio. – Melzinha disse, sinalizando as pernas nuas deLuinha.
- Até que não, você sabe, com o calor do momento. – ela deu de ombros.
As duas olharam em silêncio para as folhas escuras do parque. A noite trazia uma temperatura amena, que era sentida pela pele das pessoas um tanto mais gelada, graças à intensidade dos ventos.
Mel observou as marcas roxas nas coxas de Lua, engolindo em seco.
O que aconteceu lá dentro?
Ela acompanhou o olhar da amiga.
- Ah, isso. – suspirou. – Eu... realmente não quero falar a respeito. Sei o que as marcas te levam a pensar e provavelmente era isso o que ele estava tentando fazer. Mas eu não sei, não tive tempo de ter certeza. – ela segurou o rosto, respirando fundo e percebendo sua vista ficar embaçada. – O que na verdade me marcou àquela hora não foi o que Scott estava fazendo ou o que poderia ter feito. Nem o que eu fiz para que ele me soltasse. Ele gritou uma coisa tão ruim pra Thur. Algo tão... Cruel.
Mel arregalou os olhos, abraçando a amiga de lado assim que ela deixou uma lágrima rolar.
- E o que foi?
- Ele disse que a Iv tinha um caso com ele. Digo, com o Scott. – Lua limpou as lágrimas. – Eu acho que eu estaria até me importando mais de ter furado o olho de uma pessoa se a expressão no rosto do Thur não tivesse sido tão... Arrasada.
Mel engoliu em seco. Conectou imediatamente o que ouvia da boca da amiga ao seu flashback no Mark’s. Sim, lembrava-se agora. A pessoa com quem Ivane tivera um caso, naquele dia, tinha sido o zagueiro. O rosto satisfeito de Scott no fundo do bar parecia quase tão nítido pra Melzinha quanto as folhas farfalhando na praça.
Era isso.
- Você acha... – Mel falou com a voz desgastada. – Acha que ele poderia ter te matado,Luinha?
A menina deixou óbvio para onde suas suspeitas tendiam. Lua franziu a testa, tentando se lembrar de todos os momentos em que esteve no pequeno quarto de madeira, sob a vigília do grandalhão.
- A princípio, não. – ela respondeu sincera. – A intenção dele ao me sequestrar não era me matar. Ele queria assassinar o Thur, mesmo que isso acabasse o colocando na cadeia. Ele só queria que o Aguiar tivesse um motivo para estar naquele lugar. – ponderou por um instante. – Mas suas intenções mudaram consideravelmente quando acertei seu olho...
- Acha que ele poderia ter assassinado a Iv?
Lua balançou a cabeça.
- Ele parecia estar bastante orgulhoso de seu ‘affair’ com ela pra ter acabado com tudo desse jeito. Se bem que ele é muito estranho. – sussurrou, depois deu uma risada frouxa. – Não tenho como julgar as ações que ele foi ou não capaz de fazer.
Depois de um tempo em silêncio absoluto, apenas repousando sua cabeça no ombro da amiga, Lua se permitiu chorar. Seu coração se encheu de mágoas a tal ponto que chorar era inevitável.
Ali estava ela, com uma roupa tão curta e inadequada para o inverno londrino que chegava a se sentir seminua, com as pernas e os braços com machucados tão superficiais que nem se comparavam a dor que sentia em seu coração. Estava ali, suja, desesperada, chateada por seus amigos e pensando em algo que sua mente nunca lhe permitiu engolir: que Thur ainda amava Ivane.
A expressão de desgosto e completo horror quando ele ouviu as palavras vindas de Scott só podiam demonstrar ciúmes. Ciúmes por uma mulher cuja carne já havia sido comida pelos vermes. Como, Lua se perguntava, ela teve coragem de fazer isso com Thur? Logo com o seu Thur?
Seus soluços ficavam cada vez mais altos e, antes que percebesse, estava murmurando o que seus pensamentos gritavam:
- Cretina.
Mel permaneceu em silêncio. Por mais que fosse amiga de Ivane, os únicos argumentos que tinha a respeito da garota só a fariam concordar com Lua: ela era uma cretina.

Assim que o pai se afastou para responder algumas coisas aos policiais, Chay se sentou ao lado de Rod nas escadas da varanda. Thur estava logo ao lado.
Rod estava com um lenço apertado contra seu nariz, sentindo pela primeira vez, através da pressão que exercia sobre o rosto, a possível fratura que havia sofrido. Pensava não ser possível, mas com certeza sentia sua cartilagem nasal latejar, assim como sua gengiva.
Viu a expressão vaga de Chay e instantaneamente sentiu um aperto no peito. Perguntava-se o que eles tinham acabado de fazer. Bateram nos caras do colégio que os enfiavam em latas de lixo no fundamental. Era uma meta que Rodrigo sempre havia considerado impossível, até sentir tanta adrenalina quanto a que tinha sentido hoje.
A descarga de adrenalina, com certeza, alavancou os garotos para a vitória.
Mas apesar da satisfação, ainda sentia como se um caroço estivesse preso em sua garganta. Uma curiosidade ardente que se viu obrigado a exteriorizar:
- Chay... – começou. – Você acha possível que o Scott tenha... – Chay olhou-o, com os olhos sem brilho. – Tenha assassinado a Ivane?
O rapaz voltou novamente seus olhos pra frente pensando sobre a pergunta do amigo. Esticou seus joelhos, que estavam dobrados sobre os degraus, apoiou-se nos braços e disse, em meio a um suspiro:
- É impossível.
Thur tentou fingir que não prestava atenção na conversa dos dois garotos, apesar de ter aguçado seus ouvidos para apurar o diálogo.
- Impossível? Como se vimos muito bem o que ele é capaz de fazer...?
Chay novamente discordou com a cabeça, com a certeza transparecendo em seus olhos.
- Eu não pude levar a Melzinha para a mansão Aguiar aquela noite. – Chay estreitou os olhos, lembrando-se do passado. – Lembro-me que o motivo foi a brincadeira que fizemos ao pichar uma das paredes da Drayton School de azul e branco, no dia em que ganhamos a semifinal. Algum aluno do time adversário viu e nos filmou. Passei alguns dias na detenção. A noite em que a Ivane foi assassinada foi um deles. – fechou os olhos com o pesar. – Scott tinha participado da brincadeira também, e, como eu, saiu de lá tarde demais pra que pudesse ter feito alguma coisa.
Arthur levantou-se de onde estava pela impossibilidade de ficar parado ao ouvir uma notícia como aquela. Scott estava na detenção. Estava na detenção e nunca poderia ter chegado a tempo de assassinar Ivane.
O que ele faria agora que seu principal suspeito era carta fora do baralho? Tampou a boca com uma das mãos, sentindo as têmporas fervilharam e algumas gotas de lágrimas começarem a se formar nas margens de seus olhos. Mas não iria chorar. Precisava ser forte o bastante para impor respeito, para mostrar a Luinha que era resistente tanto física quanto emocionalmente para ser seu protetor. Ao se lembrar desse objetivo que traçou para si mesmo, voltou os olhos para a menina, que se desmanchava no colo de Mel.
Seu coração se amoleceu a tal ponto que seguiu até lá sentindo os membros do corpo formigando de forma incômoda. Quando sentou-se no meio fio, ao lado de Lua, Mel olhou-o com um olhar sugestivo, como se dissesse: “Deixo com você”.
Ele assentiu, e fixou-se, assim que Mel se levantou, nos olhos úmidos que Lua virou para ele.
- Eu sinto muito. – Thur sussurrou, segurando uma das mãos finas e geladas da menina e colocando em seu colo.
Com as costas da mão que estava livre, Luinha acariciou o rosto de Thur.
- Por me fazer sentir mais protegida que nunca na minha vida?
- Eu não te protegi o suficiente. Deixei que você passasse pelo que passou. Deixei você conseguir essas marcas. – O corpo dele estremeceu ao falar sobre alguns círculos roxos que observava nas coxas da menina. – Ele... Ele conseguiu...? Antes de eu chegar ele...?
- Não. – Lua sorriu fraca. – Você chegou a tempo. Chegou quando chamei por você.
- Luinha... – Arthur puxou-a pela nuca, fechando os olhos quando suas testas se encostaram.
Ele sentiu um alívio relaxar seu tronco, quando sentiu o calor da pele da garota. A pulsação tão viva em seu pescoço. Viva. Era isso o que ela estava. Viva e com ele.
Abaixou sua mão, deixando-a percorrer devagar todo o caminho entre o pescoço dela e seu braço.
- Cheguei a pensar que nunca mais a veria. – ele falou com a voz engasgada pelo choro preso.
Ela deixou mais algumas lágrimas rolarem, sabendo que não havia nada o que pudesse falar naquele momento. Teve o mesmo medo de que Aguiar fosse morrer. Teve o mesmo medo de que nunca mais fosse ver o homem que amava. O pavor de não ver mais seus olhos que antes eram opacos, ouvir sua voz quando era sarcástico, seu sorriso escondido que a trazia a sensação de estar em casa.
- Thur, eu... – Lua falou, três oitavas mais alto do que pretendia. Ele abriu os olhos e cravou-os nela. O que ela estava fazendo? Pensava, enquanto tentava verbalizar. Sabia que, se dissesse o que queria naquele momento, acabaria com seu relacionamento com o garoto. Mas o que podia fazer? Há meses essa verdade implorava para ser dita aos berros. – Eu... Eu te...
- Aguiar? – a voz de Mel soou mais alto que a de Luinha, fazendo com que o casal, relutantemente, olhasse para o lado. – Desculpe interrompê-los, mas... Tenho um assunto sério pra tratar com você.
Ele olhou de Mel a Luinha, beijando a segunda na testa antes de se levantar e andar até a outra.
“Eu te...” a frase inacabada rondava a cabeça do menino enquanto ele seguia com Mel até o outro lado da rua. “Eu te...” “Eu te...”. O que ela iria dizer afinal?
Suas bochechas pinicaram para saber. Para voltar lá e levá-la pra casa, de modo que pudessem ficar abraçados até seu último suspiro. Ele queria tanto poder abraçar a garota o quanto quisesse. Tanto...
- Sei que talvez isso não tenha muito sentido pra você, mas mantê-lo informado é o mínimo que devo. – ela respirou fundo de nervosismo, preparando-se para dizer o que disse em seguida: - Lembrei de ter visto Ivane se drogando atrás do ginásio, depois da semifinal, ano passado. Sei que provavelmente é uma coisa sem sentido nenhum... Mas na hora me pareceu importante. Achei que ela tivesse parado com o vício quando começaram a namorar...
- Mas pelo visto não parou. – Arthur disse com os dentes trincados.
Pelo seu tom de voz, Mel pôde perceber que ele também pensava que a menina tivesse parado de usar cocaína. Sentiu certa culpa por conseguir decepcioná-lo ainda mais com relação a ela, mas de repente ele teria uma ideia do que fazer com aquela informação. Essa era a esperança de Melzinha.
Thur olhou-a e percebeu que ela estava em expectativa. Sorriu, tentando parecer tranquilo quando respondeu:
- Há muito tempo algo vindo de Ivane não consegue me magoar, Melzinha.
- Eu sinto muito por ter dito algo assim. – levou as mãos ao peito. – Eu não deveria ter dito. Mas achei que talvez você soubesse o que fazer ao saber disso.
Arthur olhou Mel pensando um pouco sobre o assunto. Ivane ainda se drogava poucos dias antes de seu assassinato. Ele se lembrava de que, quando começaram a sair, ela consumia grandes doses de cocaína.
Aguiar deixou um sorriso frio surgir vagarosamente por seus lábios, depois sussurrou:
- E sei.
Com um lampejo nos olhos, Thur observou um carro da polícia sair de lá com o camburão lotado. Uma ambulância com a sirene ligada foi logo atrás.
Por mais assustador que isso pudesse parecer, o único sentimento que tinha ao saber que Scott jazia dentro do veículo tomou conta de todo seu ser:
Satisfação.

5 comentários:

  1. Vou postar!HIHIH!Quem bom que vcs estão gostando,a partir do próximo capítulo,muitas emoções!

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  2. Eei só tenho uma dúvida, vc postou o capítulo 20??

    Obrigaada

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  3. Postei sim!É pq a página da web,ta dando erro,ai eu to postando só aqui!Mas procura ali do lado que eu postei sim!Já se inscreveram no fã do mes?

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